«Quem vem lá, ansioso, rude, místico, nu?
Como retiro forças da carne que me alimenta?
Em todo o caso, o que é um homem? Quem sou eu? Quem és tu?
Tudo o que designo como meu chamarás teu,
Ou então perdereis tempo a escutar-me.
Não lamento o que o mundo lamenta,
Que os meses são vazios e a terra apenas lodaçal e imundície.
O queixume e a humilhação juntam-se aos remédios para os inválidos, o conformismo vai até à quarta geração,
Eu uso o chapéu como me apetece, dentro ou fora de casa.
Porque é que devia rezar? E venerar e ser cerimonioso?
Tendo examinado os estratos, analisando-os ao pormenor, consultando os mestres, calculando com rigor,
Não encontro gordura mais agradável do que a que tenho agarrada aos meus próprios ossos.
Em toda a gente vejo-me a mim mesmo, ninguém é mais do que eu, nem um grão de cereal menos,
E o bem e o mal que digo de mim digo deles.
Sei que sou sólido e são,
Os objectos do universo convergem eternamente para mim,
Tudo foi escrito para mim e devo decifrar o seu sentido.
Sei que sou imortal,
Sei que esta órbita não pode ser traçada pelo compasso de um carpinteiro,
Sei que não me apagarei como o fogo do archote que uma criança leva pela noite.
Sei que sou majestoso,
Não atormento o meu espírito para quem se defenda ou explique,
Sei que as leis elementares nunca se desculpam,
(No fim de contas, reconheço que o meu orgulho não é mais alto do que o nível onde edifico a minha casa).
Existo como sou, e isso basta,
Se mais ninguém no mundo o sabe fico satisfeito,
E se todos e cada um o sabem fico satisfeito.
Há um mundo que o sabe e é sem dúvida o mais vasto para mim, e esse sou eu próprio,
E se o reconheço hoje dentro de dez mil ou dez milhões de anos,
Alegremente o posso aceitar agora, ou alegremente posso esperar.
O apoio do meu pé é entalhado em granito,
Rio-me daquilo que chamas dissolução,
E conheço a amplitude do tempo».
Walt Withman, Canto de Mim Mesmo, in absurdo.wordpress.com)
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