sexta-feira, 15 de maio de 2009

Na Bela Vista ...



«Os habitantes da Bela Vista não estão sequestrados pela pobreza e pelo desemprego, mas sim por um grupo de delinquentes (...)» (1)


Portugal. Dois mil e nove. Cidade de Setúbal. Bairro da Bela Vista. As imagens como testemunhas. Delinquência, sim. Assaltos, roubos, medo, carros incendiados, violência. Só isso?
Os modernaços têm uma evidente, sobrenatural dificuldade em intervir na compreensão. Vejamos.
Em primeiro lugar a arquitectura. Bairros sem história, para onde se empurraram os mais desfavorecidos. Bairros fechados à luz exterior, em avenidas sujas e insensíveis ao progresso.
Em segundo lugar as pessoas. Bairros que fabricam guetos, onde a integração entre gerações é residual e onde o desespero criou a sua Lei e os seus servidores.
Em terceiro lugar, os jovens. Gerações sucessivas de insucesso, de falta de oportunidades, de falta de apoio desde o pré-escolar conduzem à marginalidade.
Em quarto lugar a família. Cada um é a sua própria família, num mundo de trabalho regulado pela sobrevivência e numa sociedade de valores conformistas.
At last, but not least, o Estado. Isto é os governos e as suas opções para a sociedade. Bairros sociais, emergentes há trinta anos, foram a aplicação das ideias igualitárias. Abdicando do apoio individual merecido ao pagamento de uma renda, em função das necessidades, construíram-se espaços oferecidos à desordem social.
Desordem oferecida por uma escola pública abandonada dos valores civilizacionais do esforço e do empenho e de uma justiça encolhida perante si própria.
E no fim de tudo o jovem, agarrado ao seu leme, aos valores seguros e fatais do não consigo, não sei , não compreendo, nunca conseguirei, como demonstração da nossa precaridade formativa.
Nos últimos dias, a paz parece ter regressado. Não a que transformará a vida das pessoas, mas sim a tranquila segurança oferecida nas ruas pela polícia e nos gabinetes pelos psicólogos. Nenhuma delas responde ao desafio da esperança e da dignidade dos que ali moram.
O primeiro-ministro está descansado. Deu mostras disso no parlamento. Basta-nos compreender o possível para segurarmos o nosso conforto instalado nos portões do palácio.

(1) Primeiro-Ministro, em declarações no debate mensal de 12 de Maio de 2009 no Parlamento

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