«Em Portugal, hoje, o Estado voltou-se de novo contra o cidadão (...) A História, a Cultura, a Identidade, o Espírito, o sentido individual e colectivo da transcendência, a educação para a partilha e a espiritualidade, são encarados, por esta mentalidade técnica, como meras cócegas da alma, jarrões da China sempre agradáveis de ostentar(...) » (1)
As culturas que se podem inscrever na História, as que o futuro lhe concede viabilidade carregam em si a voz do Homem e com ela insistem na força do espírito, na decência pública e na justiça.
O mundo contemporâneo e a sua crença numa sociedade de felicidade, justiça e paz, tal como a cultura greco-romana a sugeriu só foi possível nas sociedades informadas, onde o sistema político está organizado de forma independente. Só o cumprimento dos deveres individuais poderá garantir os direitos de todos. Do Parlamentarismo Inglês à Revolução Americana do século XVII, a construção de sociedades abertas implicou o uso da razão como princípio da organização social.
A aquisição individual pelos princípios da causa pública, a vivência desses valores no serviço da acção política, assim como uma aplicação justa e correcta da aplicação da Lei são elementos essenciais da sua arquitectura para uma sociedade que se pretende mais justa e livre. Sem isto não poderemos repensar os nossos actos, nem sonhar em concretizar neste País uma forma perene para as palavras Liberdade, Humanidade, Justiça. E sem isso «essa intermitente imortalidade» de que falava Adriano, na longínqua Roma, está perdida.
Se a organização política se afasta desse papel regulador, onde o sentido do dever público se fragiliza nos caminhos de interesses particulares; se o Estado se afasta da decência pública (a assistência a nascimentos na curva da estrada, as ideias sobre a eutanásia ou a assistência a doentes oncológicos); se o Estado promove a incompetência cultural (Museu Nacional de Arte Antiga). Se ainda o Estado estimula não a renovação da realidade, mas a sua ilusão (os casos de esquecimento na Justiça) certo que vivemos muito perto dessa decadência moral, onde a injustiça e a corrupção fazem naufragar o futuro do País.
Sem o cimento de uma consciência cultural, e sem uma organização social funcional, qualquer organização de Poder, tem ao seu dispor os escombros materiais de um passado distante.
Na História, que se insiste em não aprender, imagem de uma escola em que os valores do conhecimento estão em desagregação, existem muitos exemplos de como a falência do carácter das instituições faz regredir a sociedade humana. A evolução das sociedades não está garantida só pela sua existência. Os que gostam de passar pelo Poder deveriam compreender isso. Para o bem de todos.
(1) Miguel Real, A Morte de Portugal,
páginas 22 e 26, Campo das Letras
páginas 22 e 26, Campo das Letras
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